Vânia Maria e Marcia Lohss, RN, 20minStill:
Andreia Silveira e André Chacon
Sou HIV+ e quero casar!
Sinais vermelhos é inicialmente me apresentado como: você precisa ver esse, ele vem ganhando muitos prêmios, é um dos grandiosos desse ano. As expectativas, portanto, já subiram alguns degraus. 20 minutos atrás eu estava pensando, será que é isso tudo mesmo? Passados os 20 minutos olho pro meu eu do passado e a afirmo: é isso tudo mesmo.
Com a direção de Vânia Maria e Márcia Lohss, Sinais vermelhos nos apresenta Vânia e o seu contínuo processo de cura espiritual. A obra por vezes mostra como Vânia Maria enxerga o mundo e, por vezes, mostra como o mundo a enxerga. Seus discursos e suas performances gritam: estou viva, sou arte, meu diagnóstico não é meu calvário.
Já no início temos uma performance de Vânia Maria que transita entre espaços lotados e festivos segurando uma placa escrita: Quero casar sou HIV+. O enquadramento escolhido e os planos usados transmitem a mensagem daquela pessoa como uma instrua no formigueiro. Um corpo estranho. Abjeto. Ainda neste ato, em uma das cenas aparece algumas pessoas passando um tipo de lama ou argila no corpo, talvez pela diferença cultural e geográfica, fiquei me questionando sobre o que seria aquilo, talvez uma legenda poderia contextualizar o que estava acontecendo para que futuros espectadores compreendam melhor aquele cenário.
Um ato que me saltou aos olhos foi aquele em que a protagonista está vestida com tecidos fluidos em tons de azul e seu corpo se mescla com o céu e com o mar. Uma sensação de estar afogado entre o céu e o mar ao mesmo tempo que faz parte deles.
Ao falar sobre a vida de uma pessoa sendo HIV+, o filme ainda aborda a indelicadeza, desrespeito e rispidez com que essas pessoas são abordadas e a forma como sua privacidade e intimidade é violada. Questionamentos sobre como aquele indivíduo construiu o vírus e sobre sua vida sexual são trilha sonora para uma performance seca, quente e tenra.
A cena em que a atriz está coberta por terra e largada ao léu ainda pode ser lida como uma associação ao estigma em torno de sujeitos que são HIV+. Aquela cena de quase enterro me passa uma ideia da associação estigmatizada de que sujeitos com diagnóstico de HIV+ estavam fadados à morte. Enterrados vivos e acima da terra.
A visão estereotipada, fortalecida através do discurso, sobre sujeitos HIV+, alimentou por muito tempo estigmas que marginalizaram estes indivíduos. Romper estigmas é se organizar politicamente e criar novas narrativas sobre esses corpos, trabalho realizado lindamente por toda a equipe de Sinais Vermelhos.
Além das performances descritas, a obra é recheada de outras histórias que acontecem em paralelo. Num primeiro momento, pensar em juntar tantos contos num só produto pode parecer assustador, porém, o roteiro feito por Vânia Maria e Davi Revoredo e a montagem realizada Johann Jean conseguem juntar todas essas faces da protagonista e o transformar numa belíssima obra com sotaque e ginga potiguar.
O curta-metragem, portanto, pode ser lido como um coquetel de experiências, por vezes musical, por vezes documental, ficcional, poético, seco, ofegante, quente e esperançoso. Através de Mini histórias, que poderiam facilmente cada uma ser outra obra isolada, o trabalho nos faz refletir sobre os cuidados com nós mesmos e com os que estão ao nosso redor.
Texto produzido como produto final da oficina de crítica cinematográfica ministrada por Cecília Barroso durante a programação da 3ª Macambira - Mostra de Cinema de Mulheridades e Dissidentes de Gênero. Autoria de Carolina Tavares e Revisão Rosy Nascimento.
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